sexta-feira, 14 de junho de 2013

POLÍCIA DO ALCKMIN MATA SAUDADES DA DITADURA



por Celso Lugaret
Nunca me senti tão velho como nesta 5ª feira (13), quando, acamado com forte gripe, só fiquei sabendo pela mídia e pelas redes sociais que a Polícia Militar barbarizara o centro de São Paulo, reprimindo bestialmente os manifestantes que (até então) protestavam pacificamente contra o aumento das tarifas de transporte coletivo.

Foi a confirmação do que venho alertando há anos (vide aqui, p. ex.): está em curso uma escalada de fascistização em São Paulo, orquestrada pelo governador  Opus Dei  Geraldo Alckmin, com a cumplicidade de figurinhas carimbadas como o reitor  TFP  João Grandino Rodas (da USP) e tendo como principais provocadores os brucutus da tropa de choque da PM, vulgo Rota (aquela que se orgulha de ter coadjuvado o terrorismo de estado nos  anos de chumbo, que é sempre denunciada pelas entidades internacionais de defesa dos direitos humanos por suas execuções maquiladas em  resistência à prisão e que os vereadores paulistanos da  bancada da bala  querem homenagear com uma salva de prata).
A aposta dessa gente é numa nova ditadura. E, se o governo federal a continuar subestimando, o ovo da serpente vai ser chocado até que uma crise de maiores proporções crie um cenário favorável à sua eclosão. Os petistas parecem gostar de viver perigosamente; eu detesto saber que há uma lâmina de guilhotina pendente sobre minha cabeça.

Como estive ausente do palco dos acontecimentos, prefiro não produzir um relato jornalístico da nova  blitzkrieg

Sirvo-me, então, dos principais trechos do depoimento do jornalista e historiador Elio Gaspari, colunista da Folha de S. Paulo e de O Globo, que me pareceu o mais satisfatório da grande imprensa. 
A PM COMEÇOU A BATALHA DA MARIA ANTÔNIA

Quem acompanhou a manifestação contra o aumento das tarifas de ônibus ao longo dos dois quilômetros que vão do Theatro Municipal à esquina da rua da Consolação com a Maria Antônia pode assegurar: os distúrbios de ontem começaram às 19h10, pela ação da polícia, mais precisamente por um grupo de uns 20 homens da Tropa de Choque, com suas fardas cinzentas, que, a olho nu, chegaram com esse propósito. Pelo seguinte:
Desde as 17h, quando começou a manifestação na escadaria do teatro, podia-se pensar que a cena ocorria em Londres. Só uma hora depois, quando a multidão engordou, os manifestantes fecharam o cruzamento da rua Xavier de Toledo.


Nesse cenário havia uns dez policiais. Nem eles hostilizaram a manifestação, nem foram por ela hostilizados.

Por volta das 18h30 a passeata foi em direção à praça da República. Havia uns poucos grupos de PMs guarnecendo agências bancárias, mais nada. Em nenhum momento foram bloqueados.

Numa das transversais, uns 20 PMs postaram-se na Consolação, tentando fechá-la, mas deixando uma passagem lateral. Ficaram ali menos de dois minutos e se retiraram. Esse grupo de policiais subiu a avenida até a Maria Antônia, caminhando no mesmo sentido da passeata. Parecia Londres.


Voltaram a fechá-la e, de novo, deixaram uma passagem. Tudo o que alguns manifestantes faziam era gritar: "Você é soldado, você também é explorado" ou "Sem violência". Alguns deles colavam cartazes brancos com o rosto do prefeito de São Paulo, "Malddad".
Num átimo, às 19h10, surgiu do nada um grupo de uns 20 PMs da Tropa de Choque, cinzentos, com viseiras e escudos. Formaram um bloco no meio da pista. Ninguém parlamentou. Nenhum megafone mandando a passeata parar. Nenhuma advertência. Nenhum bloqueio, sem disparos, coisa possível em diversos trechos do percurso.

Em menos de um minuto esse núcleo começou a atirar rojões e bombas de gás lacrimogêneo. Chegara-se a Istambul.

Atiravam não só na direção da avenida, como também na transversal. Eram granadas Condor. Uma delas ficou na rua que em 1968 presenciou a pancadaria conhecida como "Batalha da Maria Antônia"...  (por Elio Gaspari)
Acredito que valha a pena tornar mais conhecida uma resposta que dei no site do CMI (vide aqui) a um comentarista sectário e desrespeitoso para com o Jacob Gorender, a quem acusou de haver  jogado a toalha  quando defendeu a necessidade de um estado democrático, ao invés da abolição pura e simples do estado.

A frase que ele citou do Gorender, de 2006, foi a seguinte:
"Eu considero que o Estado não vai desaparecer. A sociedade moderna é de tal maneira complexa, constituída de segmentos, não só de classes sociais, mas são os idosos, os homens, as mulheres, os profissionais de várias áreas, a diferença entre países. Quer dizer, tudo isso exige uma escala de prioridades. E quem é que vai tomar a iniciativa disso? É necessário um órgão superior que é o Estado. E que seja um Estado democrático, obviamente. Por isso eu falo em democracia..." 
Preferi não partir para o bateboca costumeiro nesses fóruns virtuais, aproveitando, isto sim, a oportunidade para aprofundar a questão. Creio que as colocações abaixo contribuem para a reflexão sobre caminhos possíveis para a esquerda, agora que os trilhados no século passado parecem definitivamente exauridos.

O ESPONTANEÍSMO PODERÁ TER UM NOVO PAPEL?
O Gorender, como eu, procurou uma alternativa ao esgotamento dos modelos revolucionários do século passado. Mas, ao erigir coletivos minoritários, conjugados, como o novo sujeito da revolução, parece-me ter superestimado o poder de fogo e a disposição para atuação conjunta dos comunistas, anarquistas, gays, militantes ambientais, feministas, idosos, negros, desempregados, estudantes engajados, jovens revoltados, adeptos da descriminalização da maconha, etc., etc. 


                                    Jornalista ferida no olho por bala de borracha da P.M

De certa forma, ele apenas 
substituiu o proletariado por essa espécie de   sujeito revolucionário múltiplo, mas manteve os  conceitos tradicionais, inclusive o da necessidade de uma vanguarda  regendo a orquestra  ao longo do processo, e também de um estado, ainda que democrático.

Partindo da mesmíssima constatação --a de que nossos desafios atuais exigem uma mudança profunda de estratégia e táticas--, eu cheguei à conclusão de que a era da internet faculta um novo tipo de  espontaneísmo, com o Movimento do Passe Livre, os Occupy, os escrachos de ex-torturadores e outros protestos articulados pela web, as respostas imediatas às medidas autoritárias (proibição da Marcha da Maconha) e a posicionamentos antipáticos (churrascão da gente diferenciada), etc.

Isto tudo não irá muito longe em circunstâncias normais, pois a indústria cultural vai continuar mesmerizando seus públicos, sem que tenhamos como furar o bloqueio e fazer a consciência penetrar nas grandes massas bovinizadas (pois submetidas à lavagem cerebral ininterrupta do sistema). 
Mas, com o agravamento da crise econômica capitalista e das catástrofes ambientais decorrentes das alterações climáticas, em meio ao caos que vai se estabelecer e à indignação dos viciados no consumismo quando sua  droga  escassear e eles sentirem os rigores da abstinência, poderá, sim, abrir-se uma  janela revolucionária

Então, esses grupos que desde já lutam nas ruas, com a experiência acumulada nos muitos confrontos que até então travarão, talvez somem forças para oferecer uma alternativa à sociedade. Ou seja, a vanguarda seria mais ou menos a que o Gorender anteviu, só vindo, contudo, a afirmar-se na fase superior, decisiva, da luta.  Por enquanto, os coitadezas por quem os manifestantes paulistanos lutam continuarão vendo-os como vândalos, pois assim falava Globotustra...

Na hora da verdade, contudo, estará em jogo a própria continuidade da espécie humana, que o capitalismo conduz diretamente à extinção.  Vamos torcer para que o instinto de sobrevivência, no frigir dos ovos, fale mais alto.


Por último: depois de tudo isto, haveria, com certeza, condições para substituir-se o estado pela democracia direta. Mas, difícil mesmo é chegarmos até lá. 

Então, não há por que nos digladiarmos desde já em intermináveis arranca-rabos sobre  o que virá depois

Darmos um fim ao pesadelo capitalista será uma tarefa coletiva; idem, a reconstrução da sociedade por cima dos escombros da exploração do homem pelo homem. Se as pessoas conseguirem se libertar dos grilhões atuais, decerto encontrarão, no momento certo, os melhores caminhos para a instauração de uma sociedade de homens livres, igualitária e justa.

      Post do blogue Náufrago da Utopia

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